Josival Pereira analisa trechos de entrevista concedida pelo presidente de Câmara dos Deputados ao jornal Folha de S. Paulo
Veja-se, abaixo, com perguntas e respostas, trechos de uma entrevista concedida, no fim de semana, pelo presidente de Câmara dos Deputados, Arthur Lira, ao jornal Folha de S. Paulo:
“Lula nomeou André Fufuca, que era líder do PP, como ministro do Esporte. Isso significa a entrada do seu partido de vez no governo?
Há uma aproximação de partidos de centro que não faziam parte da base do governo para essa adesão. É claro que, quando um partido indica um ministro que era líder de um partido na Câmara, a tendência natural é que esse partido passe a ser base de apoio ao governo na Câmara dos Deputados, como o Republicanos, como outros partidos.
Isso significa que todos os 49 votos do PP serão pró-governo?
Não, porque nenhum partido dá todos os votos. Mas eu acredito em uma base tranquila.
Quantos votos o governo tem hoje?
A gente cristaliza a oposição hoje em torno de 120, 130 votos cristalizados. Então, 350, 340 votos, o governo deve estar numa base resolvida, eu penso. O acordo foi mais amplo, envolve outros partidos, tem parte do PL que quer fazer parte e já vota com o governo.”
A entrevista é preciosa para o entendimento de diversas questões da conjuntura política nacional e seus desdobramentos.
- O presidente Arthur Lira, como tem ocorrido, não tergiversou. Foi direto ao ponto. Revelou com clareza a amplitude das negociações conduzidas pelo presidente Lula para garantir a governabilidade no Congresso.
- PP, Republicanos e parte do PL já são da base do governo na Câmara dos Deputados.
- Dirigentes partidários, como Ciro Nogueira (PP) e Marcos Pereira (Republicanos) podem até alegar que as legendas são de oposição ou independente, mas vale o que Lira está afirmando: dentro da Câmara, são base do governo.
- Do outro lado, os petistas não podem mais escamotear: o centrão faz parte do governo. Além dos ministérios, Lula está cedendo outros cargos importantes. Pode-se até argumentar que Lula soube negociar. Cedeu, mas não entregou o que o centrão queria. Segurou os principais ministérios, o controle relativo do orçamento e ainda nomeou ministros que já tinham boa relação com o PT.
- No modelo atual, certamente, não havia outra alternativa ao presidente Lula, que não a de fazer acordo com o deputado Arthur Lira e outros líderes do centrão para aprovar projetos importantes na Câmara e ganhar mais tranquilidade para governar.
- Preste-se atenção juma parte da entrevista na qual o deputado Arthur Lira não descarta que o acordo feito para formação da base ampla na Câmara Federal possa evoluir para acordos políticos, o que significa desdobramento dos entendimentos para a disputa das próximas eleições. Significa que PP e PT e Republicanos e PT podem fazer acordos para a disputa das eleições municipais em algumas cidades e, quem sabe, até para as eleições de 2026.
- Muitos vão considerar o acordo um descaramento, um absurdo político, uma incongruência ideológica. É tudo isso, mas não tem outro jeito. O Congresso eleito é majoritariamente conservador e de oposição ao presidente Lula. Além disso, o Parlamento conseguiu crescer em poder nos últimos anos e já divide a tarefa de distribuir verbas da União com o presidente. Fala-se que o Brasil vive um regime semipresidencialista de fato, sem, no entanto, dispor de regulamentação constitucional. Pior que, pelo quadro conjuntural atual, nenhuma das forças políticas do país dispõe de força para aprovar um modelo mais límpido e transparente. Assim, a perspectiva é que o país permaneça nesse estado de anomalia. Lamentavelmente.
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